sexta-feira, 19 de março de 2010

Datas


Existem coisas engraçadas e estranhas, mas que pouca gente questiona ou procura entender. Por exemplo, em dezembro do ano passado perguntaram-me onde eu passaria o réveillon e eu, tranquilamente, respondi: "em casa". Surpreendi os que me questionaram. Em casa? Percebi que ficaram intrigados... "Mas que menina é essa que passa o ano novo em casa?" Devem ter pensado assim. Acho curioso como as pessoas fazem questão de seguir tradições mesmo que, muitas vezes, elas não façam tanto sentido. Sei também que a maioria das pessoas acharia muito mais interessante estar numa festa, ou na rua até o dia clarear do que estar em casa. Minha casa é onde me sinto melhor, à vontade e confortável, portanto, estar nela, para mim, é centenas de vezes melhor do que estar por aí.

Mas o objetivo do texto não é enaltecer minha residência, ou coisa do tipo. É questionar as datas. Não sei quanto a você, mas o fato de todo ano ser a mesma coisa me deixa muito enjoada. Ano novo, carnaval, páscoa, são joão... É um ciclo vicioso que nunca tem fim. Isso porque eu não falei do dia dos pais, das mães, dos avós... Tudo tem seu dia específico. Eu não vejo sentido. Primeiro porque no dia em que eu precisar de uma data para lembrar de meus familiares, para dizer que os amo e sair com eles, então, algo de muito errado estará acontecendo comigo. Felizmente, pertenço a uma família que também pensa como eu, que procura avaliar valores e perceber o que verdadeiramente existe por trás dessas comemorações.

Em segundo lugar, você não acha que o comércio já se aproveita demais de nós, não? Se no Natal você esquece o presente, aí já viu... Problema na certa. Como ninguém vai contestar, o resultado a gente vê quando vai aos shoppings e mal dá pra se mexer. As datas, além de serem um tanto falsas, são uma maneira encontrada pelo comércio para tirar dinheiro de você, trabalhador, que acorda cedo o ano inteiro e vai à luta.

Mas o lado mais cruel disso tudo ainda vem por aí. É aquela parte do "pensei que todos fossem filhos do Papai Noel". Como os privilégios são para poucos, vemos, todos os anos, crianças pedindo dinheiro com aquelas caixinhas decoradas no estilo natalino. Espera um pouco! Tem um erro aí! Se crianças de rua também têm pai no dia dos pais, mãe no dia das mães e vontade de festejar... Tem injustiça nessa história. Elas não podem, porque não têm condições. Enquanto uns esbanjam dinheiro, enchendo as pessoas de presentes (mesmo que durante todo o ano não dêem muita importância a essas mesmas pessoas), outros permanecem na luta de todo dia. A luta pelo pão, pelo cobertor, pela igualdade. E isso é o que mais me dói. Eu, que não comemoro nenhuma dessas festas às quais a sociedade inteira se entrega, sinto pelos que, mais uma vez, ficaram de lado. Não porque eu ache que eles deveriam participar também, mas sim porque nessas horas eu vejo claramente a divisão que insiste e persiste e vejo gente esbanjando com futilidade e, ao mesmo tempo, gente morrendo de fome.

A sociedade está comemorando. Sem saber o quê, sem saber por quê. Não fazem questão de saber se todas essas datas fazem algum sentido, se são realmente o que parecem ser, nem a quem estão agradando... Apenas querem festa. Para muitos outros, se apenas o alimento tiverem em mãos, terá valido o dia, embora saibamos que nem sempre isso é possível.

É por isso que prefiro estar em casa. Evitando tamanha hipocrisia em tempos difíceis.

2 comentários:

disse...

Esse texto deveria ser publicado pra todo mundo refletir sobre esse ponto, isso sim!!!!

Paty disse...

Refletir... Na verdade, muitos têm medo de se enxergar no verdadeiro espelho dessa sociedade do espetáculo, onde vivem das aparências e se dizem livres, quando estão mais escravizados do que nunca às sua próprias tradições... Sem real significados.

Parabéns Gaby. A sociedade precisa de jovens pensantes e críticos-construtivos como você.